Tenho mesmo que apresentar ITBI pago por cada Cessão e Promessa de Cessão no meu caso de Adjudicação Compulsória Extrajudicial?

24/04/2024 às 17:42
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A ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA é uma medida que visa aperfeiçoar a compra e venda que não fora resolvida (com a outorga da Escritura definitiva) ainda que quitado o preço e levado a efeito o contrato preliminar (promessa ou compromisso de compra e venda desde que irrevogáveis) que embasa a pretensão. Trata-se, como se percebe, de um remédio jurídico que como sempre falamos aqui, pode ser obtido na atualidade seja através da via judicial, seja pela via extrajudicial, direto no Cartório do RGI, como preceitua o art. 216-B da LRP devidamente regulamentado pelo art. 440-A e seguintes do Provimento CNJ 149/2023. A doutrina especializada do ilustre Professor, Desembargador Aposentado do TJSP e Advogado, Dr. RICARDO ARCOVERDE CREDIE (Adjudicação Compulsória. 2004) conceitua o instituto:

"É a ação pessoal pertinente ao compromissário comprador, ou ao CESSIONÁRIO de seus direitos à aquisição, ajuizada com relação ao titular do domínio do imóvel - que tenha prometido vendê-lo através de contrato de compromisso de venda e compra e se omitiu quanto à ESCRITURA DEFINITIVA -, tendente ao suprimento judicial desta outorga, mediante sentença constitutiva com a mesma eficácia do ato não-praticado".

O ilustre especialista destaca que cabe inclusive ao CESSIONÁRIO dos direitos aquisitivos egressos do contrato preliminar a adoção do remédio visando a regularização do seu imóvel, o que sem sombra de dúvidas pode fazer com que em determinados casos uma sucessão de transmissões se descortine no caso concreto: muitos são os casos onde o PROPRIETÁRIO REGISTRAL realiza a promessa de compra e venda em favor de determinada pessoa e essa por sua vez realiza cessão da sua promessa e assim sucessivamente vai ocorrendo cessão atrás de cessão até que, por fim, muitos anos depois, o último cessionário deseje por fim a toda irregularidade que pesa sobre o imóvel que ocupa e pretenda regularizar em seu nome o imóvel para que no RGI passe a constar como novo proprietário registral. Há casos onde é plenamente defensável a tese de se autorizar a solução via USUCAPIÃO (e comungamos dessa tese também) porém não se afasta também a premissa de que em casos como o ora ilustrado o remédio adequado de primeira linha, por assim dizer, é a ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA, que inclusive pode ser administrado na via extrajudicial, à luz do art. 216-B da LRP que prescreve:

"Art. 216-B. Sem prejuízo da via jurisdicional, a adjudicação compulsória de imóvel objeto de promessa de venda ou de cessão poderá ser efetivada extrajudicialmente no serviço de registro de imóveis da situação do imóvel, nos termos deste artigo".

O par.1º do referido artigo, por sua vez, exige no inciso V seja encartado junto requerimento ao Cartório do RGI o "comprovante de pagamento do respectivo Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI)". Questão muito importante - especialmente sob o prisma do art. 289 da citada LRP (que obriga ao Registrador Imobiliário a fiscalização sobre o recolhimento de impostos devidos nos atos que lhe forem apresentados em razão do ofício) diz respeito aos casos onde a Adjudicação Compulsória - judicial ou extrajudicial - envolva diversas cessões e promessas de cessão. É obrigado nesse caso ao interessado apresentar o comprovante do pagamento do ITBI por cada "cessão" ou "promessa de cessão" - a se considerar com isso ter havido um FATO GERADOR em cada uma dessas transmissões?

A bem da verdade, lamentavelmente muitos Cartórios continuam exigindo do interessado o pagamento do imposto por CADA UMA dessas cessões, inclusive baseado em Lei local que infelizmente arrole a Cessão ou a Promessa de Cessão como fato gerador do ITBI, todavia essa exigência não merece prosperar como se verá adiante. Em muitos locais (como no Rio de Janeiro inclusive) é recorrente o caso onde os Cartórios do Registro de Imóveis lancem como exigência a apresentação dos "comprovantes de pagamento do imposto de transmissão relativos às transmissões que remontam a cadeira sucessória" que antecede a transmissão que legitimou o cessionário ao pedido da Adjudicação Compulsória, ignorando por completo a orientação pacificada do STF e do STJ acerca da não ocorrência do fato gerador nas cessões.

Simplesmente por não haver na Promessa de Compra e Venda efetiva transmissão do imóvel (que se dá apenas como REGISTRO e nunca com a LAVRATURA da Escritura Definitiva e - muito menos - da Promessa - e menos ainda - das suas Cessões) é que fato gerador do ITBI ocorrerá tão somente com a transmissão definitiva que - repetimos - só ocorre com o REGISTRO DO TÍTULO TRANSLATIVO no Cartório do RGI, a teor do art. 1.245 do Código Reale. Ora, não ocorrendo fato gerador se mostra totalmente ilegítima a cobrança de ITBI pelas promessas e com muito mais razão pelas cessões. Um verdadeiro OCEANO de decisões paira sobre a questão, todavia, ainda assim é possível nos depararmos com lamentáveis notas devolutivas, evidentemente equivocadas, exigindo o pagamento do imposto por cada uma das cessões. Uma antiga porém perfeitamente aplicável decisão do STF esclarece:

"STF. RP 1.211/RJ. J. em 30/04/1987. Imposto sobre a transmissão de bens imóveis e de direitos a eles relativos. Fato gerador. O compromisso de compra e venda e a promessa de cessão de direitos aquisitivos, dada a sua natureza de contratos preliminares no direito privado brasileiro, NÃO CONSTITUTEM meios idôneos a transmissão, pelo registro, do domínio sobre o imóvel, sendo, portanto, INCONSTITUCIONAL a norma que os erige em fato gerador do imposto sobre a transmissão de bens imóveis e de direitos a eles relativos. Representação julgada procedente, declarando-se a inconstitucionalidade do inciso VII do art. 89 do Decreto-lei nº. 5, de 15 de março de 1975, com a redação que lhe deu o decreto-lei n. 413, de 13 de fevereiro de 1979, ambos do Estado do Rio de Janeiro".

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E não se alegue que logo depois dessa decisão paradigmática sobreveio a CRFB/88"autorizando"a cobrança já que não houve qualquer modificação no entendimento já que, de fato, não é a promessa e muito menos a cessão quem constituem mesmo fato gerador já que elas sozinhas não possuem o condão de transmitir a propriedade, nos exatos termos do citado art. 1.245 do CCB que determina:

"Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis".

POR FIM, decisão recente do TJRJ que, embasada no entendimento do STF confirma a não incidência de ITBI sobre "cessões dos direitos", devendo o interessado recolher apenas 01 (um) ITBI pela transmissão efetivada por ocasião do registro da Adjudicação Compulsória:

"TJRJ. 0132466-81.2022.8.19.0001. APELAÇÃO. J. em: 20/03/2024. APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO TRIBUTÁRIO. ITBI. AÇÃO ANULATÓRIA DE LANÇAMENTOS TRIBUTÁRIOS. ADJUDICAÇÃO COMPULSÓRIA FUNDADA EM ÚNICA PROMESSA DE COMPRA E VENDA E ATOS POSTERIORES QUE CONFIGURARAM MERAS CESSÕES DE DIREITOS, QUE NÃO GERARAM A TRANSFERÊNCIA DA PROPRIEDADE. AUSÊNCIA DE FATO GERADOR. REPERCUSSÃO GERAL. APLICAÇÃO DA TESE 1124 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL:" O FATO GERADOR DO IMPOSTO SOBRE TRANSMISSÃO INTER VIVOS DE BENS IMÓVEIS (ITBI) SOMENTE OCORRE COM A EFETIVA TRANSFERÊNCIA DA PROPRIEDADE IMOBILIÁRIA, QUE SE DÁ MEDIANTE O REGISTRO ". MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. NÃO PROVIMENTO DO RECURSO".

Sobre o autor
Julio Martins

Advogado (OAB/RJ 197.250) com extensa experiência em Direito Notarial, Registral, Imobiliário, Sucessório e Família. Atualmente é Presidente da COMISSÃO DE PROCEDIMENTOS EXTRAJUDICIAIS da 8ª Subseção da OAB/RJ - OAB São Gonçalo/RJ. É ex-Escrevente e ex-Substituto em Serventias Extrajudiciais no Rio de Janeiro, com mais de 21 anos de experiência profissional (1998-2019) e atualmente Advogado atuante tanto no âmbito Judicial quanto no Extrajudicial especialmente em questões solucionadas na esfera extrajudicial (Divórcio e Partilha, União Estável, Escrituras, Inventário, Usucapião etc), assim como em causas Previdenciárias.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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